Sociedade reage à fala capacitista e misógina de desembargador do TJPA

07/06/2025 19:30
Sociedade reage à fala capacitista e misógina de desembargador do TJPA

Em um vídeo que viralizou na semana passada, um senhor idoso de aparência respeitável fez um discurso chocante e provocou indignação nas redes sociais e na sociedade paraense. Ele aparece num ambiente formal e de acesso restrito, mas seus argumentos lembram a fala de um frequentador daqueles bares de última frequentados por gente de penúltima categoria. Lugares onde o preconceito é lei e a ofensa, a glória.

Por incrível que pareça, a cena não aconteceu num boteco sujinho. Foi no Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), durante a sessão que tratava da fixação de pensão alimentícia para uma criança com Transtorno do Espectro Autista (TEA). E o orador do discurso torpe foi o desembargador Amílcar Roberto Bezerra Guimarães. Quando falava, era como se despisse a toga, símbolo da impessoalidade e imparcialidade que devem reger os julgamentos, e vestisse a indumentária dos infames.    

Estranhamente, o desembargador tentou negar à requerente direitos já consagrados na Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), na Lei 13.146/15 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), na Lei 10.406/2002 (Código Civil Brasileiro) e na Lei 12.764/2012 (Lei Berenice Piana). Em vez de garantir esses direitos, Amílcar Roberto Bezerra Guimarães defendeu a intolerância, o preconceito, a misoginia e o capacitismo, tratando a mãe da criança de forma ofensiva, com desdém e deboche.

O desembargador Amílcar disse que a criança com TEA “deixa de ser filho e passa a ser um transtorno”. Fingindo desconhecer a situação das mães atípicas, que transformam suas vidas para cuidar dos filhos, às vezes deixando emprego e estudo, enquanto a maioria dos maridos simplesmente abandona a família, ele também falou que a criança com TEA “inviabiliza a vida do pai”. 

O magistrado foi além: atacou com linguagem chula os lugares especializados no atendimento às pessoas com autismo, afirmando que são “minas de enriquecimento para médicos e clínicas”, que vão manter essa “vaca leiteira” por um bocado de tempo. Mesmo sendo o Pará um estado pioneiro no acolhimento de pessoas com TEA no serviço público, com tratamento baseado em protocolos científicos e centros que se tornaram referências nacionais. 

No mesmo tom desrespeitoso, o desembargador disse que a pensão requerida era uma “facada considerável” na renda do pai (ainda que a Lei ampare a mãe e a criança). E coroou sua fala com a seguinte frase: “Se a mãe tivesse se casado com Antônio Ermírio de Moraes, não teria esse tipo de problema”.

Tão logo o vídeo vazou, a sociedade paraense reagiu. Ele foi criticado com veemência por representantes da Câmara dos Vereadores, Assembleia Legislativa, Sindicato dos Médicos, Conselho Regional de Medicina, sindicatos de servidores do Judiciário do Pará e de outros estados. Também foi denunciado ao Conselho Nacional de Justiça, à corregedoria do Tribunal de Justiça do Pará e à Associação dos Magistrados. Sem contar com as milhares de reações das pessoas que transformam a internet em tribunal, sem dó nem piedade.

Mãe atípica e vereadora eleita com a bandeira do combate ao preconceito, reconhecida como uma das maiores militantes na defesa das pessoas com TEA, a vereadora Nay Barbalho deu o tom das reações: “As falas capacitistas, misóginas e desumanas vindas de um desembargador do TJPA são inaceitáveis e revoltantes. É vergonhoso”, afirmou. 

Com a mesma indignação, a deputada estadual Lívia Duarte foi pra cima do magistrado: “O desembargador desconhece a realidade de uma criança com espectro autista, faz um comentário ofensivo, capacitista e criminosamente preconceituoso”, acusou. Uma dezena de entidades se manifestou em apoio à mãe e à criança ofendida, e a OAB-PA formou comissão para estudar as medidas cabíveis contra o desembargador. 

Mesmo depois dessa avalanche de críticas, Amílcar Guimarães preferiu ficar calado. Mas durante esta semana o assunto voltará a dominar o noticiário e a internet. Se virá com a retratação do desembargador ou o ímpeto ainda maior dos ofendidos em enquadrá-lo na forma da lei, só o tempo dirá.

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