Caça aos bruxos: Sergio Moro respira.

Voto implacável e cristalino em suas razões e conclusões do relator do pedido de cassação dá sobrevida ao ex-juiz.

03/04/2024 14:28
Caça aos bruxos: Sergio Moro respira.

“O sistema não perdoa”
Del. Marco Ruffo (O Mecanismo)

  

Palácio do Planalto, Brasília, 21 de março de 2023. Com apenas 50 dias de empossado e 43 do putsch de 08 de janeiro, Luiz Inácio Lula da Silva, em entrevista ao site amigo Brasil247, e após dizer sentir “muita mágoa” pelo período em que ficou preso em Curitiba, soltou a pérola:

“De vez em quando, um procurador entrava lá (num dia) de sábado, ou de semana, para visitar. Entravam três ou quatro procuradores e perguntavam: ‘está tudo bem?’. Eu falava: ‘não está tudo bem. Só vai estar bem quando eu foder esse Moro’. Vocês cortam a palavra ‘foder’ aí”... Não cortaram.

Na época, o atual senador pelo União Brasil do Paraná respondera que o presidente demonstrava, com a declaração, “desequilíbrio” e uma “tentativa de diversionismo em relação às falhas do governo”.

Corta para segunda-feira, 1º de abril de 2024, um ano e onze dias após a frase indecorosa e rancorosa de Lula.

Este ano, o “Dia da mentira” no Brasil se revelaria aquele no qual um desembargador diria um monte de verdades a respeito da tentativa de cassação do mandato de senador de Sergio Moro.

O juiz a quem Lula trama o ostracismo desde que fora denunciado pelo então magistrado como o chefão dos esquemas na Petrobras e que tais, que seriam revelados pela Operação Lava Jato.

PT e PL x Moro

Luciano Carrasco Falavinha Souza é o nome do desembargador relator do pedido de perda de mandato nas ações impetradas com este fim por PT e PL que, para contrariedade dos autores, do Ministério Público Eleitoral do Paraná (MPE-PR) e de Lula, votou contra ambos os pedidos. 

Segundo as ações, Moro teria usado recursos públicos em atos de pré-campanha quando havia se filiado ao Podemos com vistas a embarcar numa candidatura presidencial, o que o teria ajudado de forma irregular na candidatura ao Senado.

Após o voto de Falavinha Souza, outro desembargador, José Rodrigo Sade, pediu vistas do processo, fazendo com que o Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) interrompesse o julgamento, que irá reiniciar nesta quarta-feira, 03.

O desembargador José Rodrigo Sade era advogado até o último dia seis de março. Ele foi indicado por Lula para última vaga que precisava ser preenchida no TRE-PR, no dia sete daquele mês.

Falavinha x MPE

Em dezembro do ano passado, o MPE-PR emitiu parecer se manifestando a favor da cassação da chapa de Sergio Moro.

As mais de 200 páginas do relatório de Falavinha Souza colocam o documento emitido pelo parquet ministerial no seu devido lugar. Dito isso e revelado o voto, é vergonha alheia que chama? 

O voto

O relator Falavinha Souza votou contra a cassação da chapa (Moro e suplentes) contraditando as teses levantadas pelos partidos e afirmando:

“Para que fosse possível concluir que o investigado Moro extrapolou limites de gastos porque usou da frustrada candidatura à Presidência para se cacifar para o Senado no Paraná, era imprescindível comprovar que ele, desde o início do projeto, tinha a intenção de se candidatar pelo Paraná. Na espécie, isso não ocorreu”.

Criminalização

O desembargador não pararia por aí: “(...) Observa-se ainda a odiosa criminalização da política. Mesmo diante da legitimidade da insatisfação da sociedade organizada, não cabe ao Poder Judiciário agir na esteira do que considera indignante, mas sim prestar a jurisdição atento às leis e, principalmente, ao arcabouço constitucional vigente”, disse em seu voto.

Arrasador e desforra

Para Merval Pereira, em O Globo, o voto de Falavinha Souza foi arrasador não apenas sobre a tentativa de arrancar um mandato conquistado pela vontade soberana da maioria do povo paranaense, mas, também, na “quase denúncia” de que as ações se tratam de retaliação e desforra.

“Só vai estar bem quando eu foder esse Moro”

Merval atribui a retaliação ao PT (leia-se Lula). Já a desforra, àqueles que não admitiram a sua candidatura presidencial e não se conformam com a sua “maiúscula” vitória eleitoral na terra natal. 

Sobre o PL, o jornalista e presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL) lembra sua saída atirando do governo Bolsonaro, e os que lhe culpam pela derrota de Alvaro Dias, responsável por endossar sua candidatura à presidência. 

Fragilidades e ingenuidade

O voto do desembargador não deixa pedra sobre pedra quanto à fragilidade das acusações. Em relação à caça às bruxas promovida contra Moro e sua chapa, o magistrado reforça o componente vingança do caso e dá uma fustigada no próprio ex-juiz que, para ele, se comportou como um ingênuo naquele pântano ao qual ousou confrontar enquanto responsável pela operação que abalou o Brasil:

“É muita ingenuidade acreditar que o investigado, atuando como juiz em grande investigação de combate à corrupção que afetou razoável parte do quadro político, ao sair de magistratura e ingressar no governo beneficiado eleitoralmente pela indicada operação, não seria atacado”.

Ele continua:

“(...) Que saindo desse governo atirando não receberia retaliação futura e, ao fim e ao cabo, sair candidato e sagrando-se vencedor em candidatura ao Senado contra aquele que lhe abriu a candidatura presidencial, não poderia ser alvo de desforra”, relatou.

(íntegra do voto)

A luta continua

Sergio Moro, o advogado que o defende e os (poucos) aliados na política que tem sabem que, apesar da frustração dos seus inimigos com a contundência e fundamentos do voto do relator, a briga está longe do fim.

Eles, os seus inimigos, contam com o TSE para a cassação definitiva, instância onde o senador deve recorrer caso seja cassado no Paraná, a mesma que será provocada a se manifestar se Moro for absolvido no julgamento em curso.

Com a retomada do julgamento nesta quarta, dá-se como certo o voto pela cassação do desembargador que pediu vistas, José Rodrigo Sade.

Coincidência de 126 milhões de dólares

Uma curiosa coincidência tornou-se pública neste já icônico 1º de abril. Na mesma data foi divulgada a notícia na imprensa de que a empresa Trafigura, com matriz em Cingapura e sede na suíça, concordou em pagar 126 milhões de dólares para encerrar uma investigação nos EUA sobre a sua atuação na corrupção na Petrobras desbaratada pela “Lava Jato”.

Rigores lá x impunidade cá

Não é a primeira vez que se lê, de 2018 pra cá, uma notícia como essa, apesar da coincidência parecer conspirar a favor de Moro.

Odebrecht, JBS e outras gigantes têm sido chamadas às Cortes de outras nações para que se defendam e paguem pela roubalheira que o PT e seus sequazes teimam em querer transformar em culpa dos seus julgadores.

“O sistema não perdoa”

Só nos resta torcer e ter esperança de que um dia a casa caia para essa patota do mal. Afinal, como disse o delegado interpretado pelo genial Selton Mello na série “O Mecanismo”, cujo juiz, Paulo Rigo, também foi inspirado em personagem real e é retratado na segunda temporada como alguém seduzido pela fama, “o sistema não perdoa”.

Ironia do destino, hoje é Sergio Moro quem mais pode sentir isso na pele. Ontem, foi outro algoz da devassidão com o patrimônio público promovida na Petrobras: o deputado federal cassado e mais votado pelos paranaenses em 2022, ex-procurador Deltan Dallagnol.

PS: Esta coluna deve ser atualizada ainda hoje. 


Desembargadora também pede vistas

Retomado o julgamento, conforme se indicava, o desembargador José Rodrigo Sade votou contra o relator e pela cassação de Moro, abrindo, assim, a divergência. Em seguida, a desembargadora do TRE-PR Claudia Cristina Cristofani também pediu vistas e o julgamento prossegue na segunda, 08 de abril, com o placar atual de 1 x 1. 

Coluna atualizada às 16:25 - 03/04/24.

 

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